José Mendonça da Cruz, Corta-Fitas, 14 de Setembro de 2016
O juiz Carlos Alexandre deu uma entrevista em que
explicou quem era, e tudo o que disse de si está solidamente comprovado pela
sua vida, a sua carreira, e o testemunho de quem o conhece ou com ele
trabalhou. Mas o juiz Carlos Alexandre cometeu um erro grosseiro de avaliação:
avaliou mal o país e o tempo em que vive, incomensuravelmente mais rascas do
que julga ou desejaria. Compreende-se, pois, que logo lhe tenham caído em cima
os barões do país pardo e da corrupção, obviamente acolhidos e aclamados na
comunicação social avençada, e inevitavelmente acompanhados
daqueles idiotas úteis que seguem qualquer carroça de pruridos
politicamente correctos, na ilusão de mostrar equilíbrio e equidistância.
O juiz Carlos Alexandre avaliou mal.
Declarou-se católico praticante, e disse que a fé o
estrutura e fortalece. Ofendeu o credo «laico» da redutora acepção
socialista, menosprezou jacobinos e maçons.
Contou com alegria que tem uma família sólida e
tradicional, com a qual se sente feliz. Desconsiderou, pois, as virtudes
fracturantes.
Revelou serenamente que trabalha muito, ganha
pouco, e vive uma vida de austeridade e contenção. Mostrou-se, portanto,
displicente com uma governação que virou a página da austeridade, que
defende a redução do horário de expediente para os trabalhadores (desde que do
sector público), e celebra o fausto, (desde que reservado a quem
tem políticas para as pessoas). E, pior, desprezou as nobres carreiras daqueles
defensores da coisa pública que, à força do seu dinâmico optimismo, saltaram do
Clio para o Mercedes S, do apartamento para o palacete e a casa de férias, da
mediania para o enriquecimento sem causa ou explicação, do anonimato para a
gloriosa inutilidade de algum observatório ou fundação.
O juiz Carlos Alexandre apresentou-se, em resumo,
(e a sua vida e carreira, repete-se, parecem confirmar que é assim) como um
homem sério e bom, incorruptível, estranho ao deslumbramento
das mordomias, do dinheiro a rodos, dos pied à terre em
Paris. Mais grave ainda: o juiz pareceu manifestar uma inabalável fé na Justiça,
mesmo naqueles casos a que o programa do PS chama perseguição a políticos
(seus).
Eis, pois, em pormenor e por extenso, o mais álacre
manifesto contra o tempo novo português.
Que juiz deve servir, então, se Carlos Alexandre,
que vai tão ao arrepio do miasma, não serve?
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