sexta-feira, 10 de outubro de 2014


O aborto


Inês Teotónio Pereira

A verdade é que o ónus não está só no Estado, ele continua nas pessoas. O aborto não é um assunto encerrado. É um assunto adormecido.

O assunto parece estar resolvido: quem quer abortar aborta e quem não quer não aborta. As razões que motivam as duas opções são várias, pessoais e intransmissíveis. Cada um sabe de si. O Estado só tem de abrir as portas dos hospitais, pagar um subsídio e sair de fininho deste tema fracturante. Há cerca de sete anos os portugueses decidiram que a forma mais justa de lidar com o melindroso assunto é conceder liberdade total às mães das crianças. Decidiu-se que o Estado não se deve meter nesta relação íntima e muito menos substituir-se à mãe na decisão. E desde então pouco se tem falado do assunto.

O debate há sete anos foi aceso, intenso e apaixonado, e a emoção tomou conta da razão. À pergunta pouco directa e concisa «Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas 10 primeiras semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?», os portugueses responderam que concordam. Falou-se do início da vida, do embrião, do feto, dos bebés, da gestação e em cada português encontrou-se um filósofo e um cientista. E o dilema adensou-se: se há vida é crime, se não há vida não é. Há vida ou não há vida? Uns dizem que sim, outros garantem que não. Mas havendo vida a anterior lei que permitia o aborto em alguns casos também não é válida. Pois, mas cada coisa a seu tempo. Havendo tantas dúvidas, não será melhor deixar que seja a mãe a decidir se o embrião é vida ou não? Afinal o corpo e o embrião são dela. Sendo uma questão de consciência, ficou resolvido que decide a mãe. E o pai, tal como o Estado, não conta.

De seguida fomos todos para casa de ombros caídos ou cantando vitória. Mas fomos todos para casa. Passaram mais de sete anos e o tema já não é palpitante. De vez em quando alguém grita (e bem) que é uma injustiça o Estado isentar as mães que abortam por opção de pagarem as taxas moderadoras, mas pronto. Pormenores. Esta é uma causa fracturante do passado.

Entretanto vamos sabendo dos números: entre 2011 e 2013 registou-se uma média anual de 19 mil abortos a pedido da mãe em que cerca de um quarto foram repetições. O porquê de tantos abortos ninguém sabe e poucos querem saber. Sim, era melhor que os números não fossem estes. Sim, era muito bom que ninguém decidisse interromper as gravidezes e que em vez de 19 mil abortos pudéssemos engrossar os números da natalidade em 19 mil. Mas o povo decidiu e a liberdade neste caso deixou de ser um valor supremo e passou a ser um valor divino. O centro da questão passou a ser a política de natalidade e família e talvez assim se dê a volta aos números.

Mas a verdade é que o ónus não está só no Estado; continua nas pessoas. O aborto não é um caso encerrado. É um caso adormecido. Quando se delegou a decisão nas mães, virou-se ao mesmo tempo as costas às que decidem abortar, encolheu-se os ombros às razões e tomou-se a decisão mais neoliberal de todas. Conceitos como o bem comum, a justiça social ou a igualdade de direitos foram arrumados na gaveta com o socialismo de Mário Soares em tempos idos do FMI.

A Igreja é a única instituição que garante em uníssono que um embrião é vida, mas ainda assim os portugueses, dos quais 81 por cento respondiam no censo de 2011 ser católicos, decidiram pela opção da mulher. Passaram sete anos e a verdade é que a lei precisa de ajustamentos, as mães precisam de aconselhamento antes de decidirem e de apoio concreto para escolherem de facto em liberdade. A decisão de 2007 não isenta ninguém, pelo contrário, responsabiliza-nos a todos. Sejam eles do sim ou do não, sejam eles políticos ou eleitores. Neste tema não há culpas, há apenas deveres. Deveres que não se esgotam no segredo das urnas ou no primeiro dia dos mandatos.





quarta-feira, 8 de outubro de 2014


CNAF apoia inclusão de avós

nos cálculos do IRS



A Confederação Nacional das Associações de Família considerou, esta terça-feira, uma «revolução de mentalidades» os avós poderem ser incluídos nos cálculos do IRS, mas defende que esta reforma podia ir «mais além».

O jornal «Público» avança na edição desta terça-feira que, além dos pais e dos filhos, também os avós a cargo vão poder ser incluídos no quociente familiar que determina a colecta do IRS.

Esta proposta faz parte do projecto final da Comissão de Reforma do IRS, nomeada pelo Ministério das Finanças, cujo prazo de entrega ao Governo terminou esta terça-feira.

A CNAF considera esta medida «muito positiva», mas observa que é limitada por um rendimento não superior à pensão mínima do regime geral (259,4 euros).

«Mas, independentemente das limitações, estamos perante uma verdadeira revolução de mentalidades», afirma a Confederação Nacional das Associações de Família (CNAF) em comunicado.

A Confederação lembra que já tinha apresentado esta proposta no seu parecer à reforma do IRS, a par de benefícios fiscais também para o número de filhos e para as famílias monoparentais.

«Aparentemente, a situação das famílias monoparentais ainda não foi contemplada e o número de filhos a cargo para efeitos de cálculo de quociente familiar era já público», adianta.

Apesar de desejar que esta medida «fosse mais além», a confederação considera que se está a iniciar «uma nova cultura de encarar a família em termos fiscais».

O facto de o IRS passar a admitir os ascendentes como parte integrante de um núcleo familiar é «uma revolução cultural que coloca de forma mais presente o conceito família entre aqueles que norteiam a política fiscal», sustenta.

Esta medida pretende «incentivar a relação afectiva e funcional entre os mais idosos e os elementos activos de uma mesma família, aliviando um pouco a pressão sobre as instituições de apoios à terceira idade (lares, misericórdias, etc.) e humanizando mais a relação intergeracional».





terça-feira, 7 de outubro de 2014


Ciganos com turma própria em Tomar

provoca ataques nas boas consciências


Luís Lemos

As boas consciências que por aí andam, quer católicas, quer ateias, multiculturais de gema, ficaram muito indignadas com a formação de uma turma para ciganos na Escola Primária dos Templários, em Tomar. E então essa famosa «Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial» já pediu explicações...

Sim, de facto não está certo. Numa turma só de ciganos, como é que se pode gamar material escolar, mochilas, casacos, relógios, telemóveis, euritos, etc., aos colegas?

E mais injusto ainda. Fartam-se os ciganos de pagar impostos com os seus pouco rentáveis e legítimos negócios (que nem dão para pagar a renda das casas em que foram alojados por nossa obrigação) e depois os seus filhos não têm direito a uma integração escolar decente, ao lado dos senhores!

Cá por mim, para acabar com esta discriminação, deveria haver uma contabilidade fiscal separada para que toda a colecta oriunda da etnia fosse efectivamente aplicada em benefício das suas crianças, da sua saúde e da sua habitação! E, dado que sobra ainda muito dinheiro, até se poderiam pagar os ordenados dos funcionários da tal Comissão de protecção e mesmo aumentar os seus escassos efectivos, que andam assoberbados de trabalho com tanta discriminação dos contribuintes senhores! A tal Comissão de protecção deveria exigir que assim fosse! A justiça social e o multiculturalismo assim o exigem!

A tal Comissão de protecção está a dormir ou quê? Ou estará feita com os discriminadores, racistas, xenófobos, reaccionários e nazis?! É de desconfiar! Cuidado! Se assim é, é muito grave! Além de imoral, é ilegal! Atenção, DIAP!

Aliás, para que não haja suspeitas de jogo duplo por parte dessa Comissão, os seus membros deveriam depositar no Tribunal Constitucional as suas declarações de interesses, indicando nomeadamente quantos ciganos existem nas turmas dos seus filhinhos ou netinhos, quantos ciganos conhecem na produção, quantos ciganos empregam, quantos ciganos moram nos seus prédios e a quantos hectómetros ou quilómetros das suas residências é que moram ciganos. Não seria preciso – nem convém – declararem se já assistiram alguma vez a ciganos (educadores das crianças ciganas) passarem à frente das pessoas numa bicha, a fazerem arruaças nos bancos dos hospitais, com ameaças a médicos, para passarem à frente de toda a gente, ou se estavam do lado da repressora GNR ou do bondoso Pedro Bacelar de Vasconcelos no caso João Garcia (ver em http://moldaraterra.blogspot.pt/2010/08/pedro-bacelar-de-vasconcelos-ex.html).

E assim, com essa declaração de interesses, certamente repleta de caridade, afastariam todas as suspeitas e demonstrariam que estão de alma e coração com a nobre causa...