terça-feira, 25 de abril de 2017

Prazeres que conduzem à psicose, distracções que preparam para o trabalho




Plinio Corrêa de Oliveira, IPCO, 23 de Abril de 2017

Todos os sociólogos deploram a exagerada concentração demográfica nos grandes centros modernos. E apontam como uma das razões deste facto a atracção que as diversões das cidades muito desenvolvidas exercem sobre a alma simples do homem do campo.

Iluminação pública esplêndida, zona comercial muito movimentada de dia, decorada de vitrines resplandecentes à noite, cinemas com anúncios aliciantes, bares, boîtes, confeitarias, restaurantes, botequins de rádio violentamente sintonizado e coruscantes luzes, enfim atracções para todos os gostos, todas as bolsas, todos os vícios. É hoje o quadro já trivial, das megalópoles modernas, de que o Rio de Janeiro e São Paulo nos oferecem o exemplo típico.

As atracções deste género são feitas para excitar, empolgar, pôr em desvario as pessoas. Elas criam uma sede de prazeres sempre mais violentos, emoções sempre mais fortes, vibrações sempre mais intensas. E é assim que «descansa» um pobre homem que trabalhou intensamente o dia todo.

A distensão dos prazeres castos e calmos do lar, ou de uma vida razoável, temperante, tranquila, parecem aos viciados em excitações, das megalópoles, de um tédio insuportável.

E, assim, só a intemperança, a excitação e o vício divertem. É de admirar que neste ambiente sejam tantos os pecados e tão terríveis as psicoses?

A nossa fotografia apresenta um dos mil, ou antes dos milhões de aspectos que esta excitação apresenta. Lado a lado, um jovem robusto urra num rictus que tem um quê de entusiasmo, um quê de gemido, um quê de imprecação, uma jovem sorri deliciada, enlevada, como que sentindo escorrer um deleite interior em todos os seus nervos, e outro jovem, sumamente atento, utiliza uma revista como corneta. São três jovens que «descansam» divertindo-se. Com o quê? Um match? Um torneio? Não… ouvem um jazz!

Aí está uma manifestação extrema de um facto psicológico que em proporções mais discretas é comum. Se assim se vibra com o jazz, que dizer das vibrações provocadas pelo cinema, pela rádio e pelo desporto? Não é assim precisamente, que as almas acabam por perder o gosto do lar e do trabalho, ou por cair na psicose?

* * *

Num botequim popular de uma aldeia alemã, terminada a faina diária, cinco camponeses divertem-se, a ouvir uma leitura, comentada, que um deles lhes faz, à luz de um candeeiro. Homens de meia idade, fortes, calmos, que encontram um prazer inteligente e cheio de espírito, nesta coisa tão agradável e tão simples que é uma leitura feita com «verve» numa roda de companheiros que sabem analisar, comentar e sorrir. Prazer sem gastos, tranquilo e tonificante, que distrai sem viciar, e prepara o homem para novos esforços, por uma sábia distensão.

Note-se que não se trata de intelectuais, mas de simples camponeses, os quais ainda apreciam este prazer supremo dos antigos, hoje quase extinto, isto é, uma boa conversa.

Mas este ambiente espirituoso e recto tem de resultar de condições gerais da vida. Se estes homens tivessem passado o dia inteiro a trabalhar num ambiente trepidante, se tivessem viajado horas num comboio de subúrbio, se ao lado da sua calma e decente «brauerei» houvesse um cinema «deslumbrante», e o rádio do botequim vizinho estivesse a encher o quarteirão com as notícias perturbadoras da política, ou das crises económicas, descrevendo o último crime, ou difundindo um jazz «electrizante», poderiam eles conversar e descansar assim?

Não há algo de muito profundo a mudar, nestas condições gerais da existência hodierna?