sábado, 10 de dezembro de 2011

Ciúmes em Família: Brigas entre irmãos

André Pessoa *
Depois da chegada do novo irmão, e vencida a manifestação dos primeiros ciúmes, os pais esperam que os filhos se amem, naturalmente compartilhem tudo, sejam solidários e cedam com tranquilidade. Ao contrário, observa-se que os pais terminam por padecer com a crescente rivalidade, hostilidade e brigas intermináveis entre seus filhos.

Para correr, é natural que antes se aprenda a andar, o que acontece à custa de inúmeros tombos. O comportamento virtuoso também requer muito esforço, suor, aprendizagem e experimentação. No confronto, os irmãos aprendem a procurar saídas, a negociar, a ceder, a conhecer seus próprios limites e capacidades. As desavenças permitem a vivência da agressividade de maneira não destrutiva, e a oportunidade de adquirir controle sobre os próprios sentimentos. Reconhecer que a luta vale a pena ser disputada é uma conquista valiosa. Esse processo de aprendizagem não é instantâneo. Evolui com a idade e o objecto de disputa. É educação efectiva, estruturação do carácter e personalidade, que os irmãos proporcionam-se continuamente.  

As brigas entre irmãos deveriam ser resolvidas entre eles. O sábio ditado que entre marido e mulher não se mete a colher, vale também para as desavenças fraternas. Hoje é comum que os pais interfiram nessas brigas precocemente. Seja porque se revoltam pela irrelevância e banalidade do objecto e motivo da desavença, seja porque os ciúmes são os verdadeiros motivos. Os pais não deveriam interferir, pois é difícil que o façam sem tomar partido, o que acaba por gerar ressentimentos. Ambos amam os pais e desejam seu amor exclusivamente para si.

Os pais, que observam a briga, deveriam intervir somente se a discussão ficar violenta e injusta, em palavras ou actos, quando os filhos perdem o controlo e o respeito mútuo. Interferem, não para dar solução à desavença, mas para fazê-los ver que é possível se expressar e argumentar sem destruir e ofender o outro. Amainam os ânimos, sem exageros, para não dar a entender que os filhos são perigosos uns para os outros. Ao contrário, com carinho e um «deixa-te disso», para que aprendam a  controlar-se, a desculpar e a fazer as pazes. O adulto, com tolerância e controle, auxilia aos filhos a encontrar os seus limites.

Evitar que o ciúme se manifeste é uma tarefa árdua dos pais já discutida noutros artigos. Os mais novos reclamam das regalias e responsabilidades que desfrutam os mais velhos, e esses dos carinhos e atenção dispensado aos mais novos, que eles também tiveram à seu tempo. Há sempre a desconfiança de que o outro é mais privilegiado, assim como o jardim do vizinho é mais verde.

Se ao mais velho, por exemplo, se passar o encargo de ajudar na educação dos menores, pode acontecer que queira assumir o papel dos pais tentando impor-se e corrigir aos irmãos sem autoridade de facto. Não devemos diminuir sua responsabilidade, mas sim lhe fazer ver que a ajuda que se espera é principalmente a de ser bom exemplo aos menores. Recai sobre o mais velho a dura tarefa de ser o primeiro a ceder nas brigas, principalmente se a diferença de idades é maior. Saber calar para terminar uma discussão interminável tem mais valor do que se concluir quem tem razão, pois o esforço de abdicar da réplica pressupõe crescimento em virtudes.

As brigas são naturais, mas incomodam aos pais pelo barulho que provocam e porque custa ver que os filhos são feitos de barro. Não são o problema, e sim a solução, pois por meio delas os irmãos aprendem a conviver. Há tantas outras situações que são mais graves, como a desobediência ou mentira, e que passam despercebidas ou esquecidas por serem silenciosas.

É importante que as desavenças aconteçam entremeadas de longos momentos de boa convivência e harmonia. À medida que os filhos entendem as diferenças de personalidade e opinião, encontram seus espaços e gerenciam o proteccionismo dos pais, conseguem manter uma relação de amizade e respeito mútuo, e as brigas espaçam-se. É sinal de amadurecimento.

O amor fraternal nasce no momento mágico da chegada do novo irmão, e perdura por toda a vida. Se antes achavam que o outro era um privilegiado, terminam por concluir que ambos o são por se terem mutuamente. Parabéns aos pais que proporcionam a seus filhos o privilégio de terem irmãos.


* André Pessoa é pai de seis filhos, Mestrado em Orientação Familiar por Navarra, ministra cursos e palestras de Educação de Filhos desde 1995; Graduado pelo IME (Engenharia), Pós-Graduado pela PUC (Administração), FGV (Contabilidade Gerencial), ISE (Programa de Treino de Executivos) e Navarra (Orientação Familiar); Consultor da Accenture.

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