segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016
O holocausto do casamento?
Pedro Afonso
O número de casamentos tem vindo a diminuir de forma consistente, desde há mais de uma década. Além disso, o nosso país tem mantido, nos últimos anos, uma taxa anual de cerca 70% de divórcios (dados da PORDATA). Muitas das separações e das rupturas não entram para esta estatística, pois há cada vez menos jovens a casar-se, optando por «coabitações amorosas», o que faz supor que o divórcio venha a alcançar números ainda mais elevados.
Mas afinal, o que é que está a falhar no casamento? Por que é que esta importante instituição está em crise?
O Homem actualmente está permanentemente a ser incentivado para não ter convicções firmes, sendo constantemente impelido para a mudança. Esta activação frenética, que origina uma enorme instabilidade nas mentes sãs, é o motor da sociedade de consumo, sendo mantida pela crise profunda de valores do Homem moderno, dando origem a uma perpétua insatisfação. Instala-se, assim, na sociedade a ideia de que nada é definitivo. As relações entre homem e mulher devem ser, por princípio, descartáveis e o bem-estar reside na fugacidade e na subjectividade do amor individual.
Para muitos a mudança é o progresso; o progresso consiste em avançar para todo o sempre, ainda que a mudança possa ser muitas vezes dirigida não para «a terra prometida», mas para o precipício das paixões. É o que acontece quando se transforma o casamento numa instituição volátil, na qual os lanços contratuais são predominantemente emocionais e podem construir-se e reconstruir-se livremente, muitas vezes subordinados a actos impulsivos ou a estados de alma.
Não conheço nenhuma instituição humana que tenha sido tão atacada nos últimos tempos como o casamento. Basta ver alguns filmes e séries com maior sucesso nos últimos anos para se perceber a mensagem que tem sido repetidamente transmitida: a infidelidade passou a ser uma virtude, e a fidelidade, e a perseverança no amor, um sinal de imperfeição, um vício dos fracassados, uma atitude retrógrada daqueles que (ainda) «não se libertaram».
O casamento não tem sido devidamente defendido, pois quando entra em crise o caminho mais fácil que tem sido seguido é a ruptura e a dissolução. Há cada vez mais psiquiatras e psicólogos direccionados para a terapia do divórcio, em lugar de realizarem terapia de casal. Basta fazer uma consulta à livraria online Amazon para se constatar que os livros publicados sobre «como sobreviver a um divórcio» são em número claramente superior ao dos livros destinados a «salvar um casamento em crise».
Para que o casamento venha a subsistir como uma instituição sólida e uma célula fundamental da vida em família e na sociedade é necessário que os casais se preparem melhor. Importa afirmar sem hesitações que muitos dos que querem casar não estão preparados para assumir a importância deste vínculo. Para que o casamento venha a ter maiores hipóteses de sucesso, o casal tem de estar disposto a satisfazer pelo menos quatro características na relação: compromisso, renúncia, entrega e perseverança. Quem não reunir (ainda) estas qualidades, então o melhor é não se casar, pois o mais certo é que o casamento fracasse.
O grande problema deste autêntico «holocausto do casamento» – como lhe chamou Barbara Whitehead, no seu livro The Divorce Culture – é que talvez muitos divórcios não teriam ocorrido se houvesse um maior apoio a muitos casais em crise. Através da minha experiência clínica como médico psiquiatra, penso que esse apoio é claramente insuficiente.
Os dados estatísticos falam por si, mostrando que entre nós o casamento parece não ter futuro. O compromisso vivido no casamento deixou de ser assumido como uma escolha humana livre e um desafio praticável. A ideia de se criar um vínculo duradouro – para toda a vida – é visto como algo inexequível, algo que é impossível alcançar. Mas é falso que não seja possível a qualquer ser humano estabelecer um vínculo duradouro com a pessoa que ama.
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