Inês Teotónio Pereira, ionline 12 de Setembro de 2015
A Teresa e a Rosa aturam os meus filhos desde pequeninos. Não sei como, mas aturam. E também não sei como mas gostam de os aturar.
Uma coisa é entregar um filho numa creche, outra coisa é entregar um filho à Teresa e à Rosa. A Teresa e a Rosa aturam os meus filhos desde pequeninos. Não sei como, mas aturam. E também não sei como mas gostam de os aturar. É uma vocação. Eles são todos diferentes, mas elas são as mesmas, estão sempre na mesma, e gostam de todos. Desde que o meu filho mais novo nasceu que conto os meses para o poder entregar à Teresa e à Rosa. Acho mesmo que vou tendo filhos porque sei que há uma altura na minha vida e na deles em que os posso co-educar com elas.
Mas este é diferente. Este não foi com os irmãos para o Pinhão. Foi sozinho, o meu menino. Além disso, este é diferente, este não sabe o que quer dizer não, tem alguma dificuldade em ser contrariado e tem cinco pais e mães que lhe fazem todas as vontades e que têm como principal missão deseduca-lo. Por isso, quando o entreguei no Pinhão, no princípio da semana, parecia que era a primeira vez que deixava um filho numa escola. Foi uma vergonha. «Este vai ser expulso», pensei baixinho. A criança passou quatro dias a gritar. Sempre que o deixei, ele, que tem como programa preferido andar no «carro mãe», berrava como se fosse para o corredor da morte e reclamava que queria ir para o «carro mãe». No primeiro dia fiquei lá. Nesse dia a criança que nunca tinha visto uma galinha tão perto, pôs o dedo na capoeira e eu gritei com medo que uma galinha o picasse. Sim, gritei. Confesso a minha falha, a minha vergonha. Ficaram todas a olhar para mim: «Inês, se a galinha o picar ele não volta a pôr o dedo…». Foi então que percebi: o problema do meu filho mais novo não é ele, sou eu – estou velha. Há dez anos, há treze, não tinha pestanejado perante uma capoeira, tinha olhado de frente para as galinhas e encarado uma picadela no dedo de uma criança de dois anos como a coisa mais natural do mundo. Agora não. Agora, que já me perguntam se sou avó (apenas duas pessoas, é certo, e as duas vêem mal, claro) deste meu filho, tremo perante um degrau com medo que ele caia e sou eu, sim sou eu, que lhe faço todas as vontades. Além disso, este é como se fosse um filho único e isso dificulta tudo. Estou velha e tenho um filho único. Não há mistura mais explosiva.
Valeram-me, como sempre, a Teresa e a Rosa. «Teresa, o que é que eu faço: deixo-o cá a chorar, levo-o, fico cá?» Ao sexto filho tive dúvidas. A Teresa foi condescendente e explicou-me o óbvio: ficar é pior para ele. Sim, sofri sempre que o deixei a chorar. Dantes sabia que passados dois minutos ele estaria a brincar e não me comovia com o histerismo das crianças. Mas agora não. Agora tive dúvidas. (Desculpe Teresa). Além disso até fiz aquelas perguntas parvas: comeu bem, fez cocó, riu-se muito, tem amigos? Bahh. Estou velha.
Até
que ao quinto dia, exactamente o mesmo dia em que Deus criou o Céu e a Terra, o
meu menino calou-se. Saltou do meu colo para o colo da Rosa e nem uma lágrima.
Nem uma. Disse-me adeus e lá ficou, feliz e contente. Ao quinto dia o meu
menino deixou de ser menino da mamã e já é um menino Pinhão. Chegou a casa
sujo, cansado e a rir. Também comeu tudo e se lá estivesse ficado mais meia
hora tinha feito o dito cocó. Agora sim, já posso ser uma mãe velha, ou sénior
como agora se diz, já que o meu filho é um Pinhão a sério e tem a Teresa e a
Rosa para o educar. Amanhã,
como Deus, vou descansar.
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