quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015


Legalização das drogas leves:

uma irresponsabilidade política


Pedro AfonsoPsiquiatra

A ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, defendeu recentemente, numa entrevista à TSF, a legalização da venda de drogas leves em Portugal e a sua venda nas farmácias. De acordo com a sua argumentação, os ganhos para os cidadãos seriam alcançados graças à diminuição de outros crimes.

Infelizmente, a sra. ministra parece desconhecer que  as designadas «drogas leves» não são, na realidade, assim tão leves, já que podem provocar danos gravíssimos a quem as consome. Tomemos como exemplo o cannabis. Esta droga muito popularizada e consumida na nossa sociedade, inclusivamente por jovens, pode contribuir para o aparecimento de várias doenças psiquiátricas.

O consumo de cannabis (excluindo, obviamente, a utilização restrita dos seus derivados para alguns fins terapêuticos) aumenta o risco do aparecimento de psicoses, que impedem uma pessoa de pensar adequadamente e interferem negativamente, entre outros factores, com o rendimento cognitivo (a memória, concentração, etc.), prejudicando gravemente o funcionamento profissional e escolar.

Já há muitos anos que existem inúmeros estudos científicos que associam o consumo de cannabis à esquizofrenia. Por exemplo, em 2011, o psiquiatra holandês Jim Van Os publicou um estudo longitudinal com a duração de dez anos, tendo comprovado que o consumo regular desta droga aumenta o risco de desenvolvimento de sintomas psicóticos. Além disso, o consumo de cannabis tem sido associado a um aumento do risco de: comportamentos antissociais, ideação suicida, dificuldades no relacionamento interpessoal, consumo de outras drogas ilícitas, designadamente drogas injectáveis, etc..

Por inúmeras razões, intoxicou-se a sociedade com a ideia falsa de que as «drogas leves» não causam danos à saúde. Existe ainda uma ideologia que defende a liberalização das drogas, vendo o consumo das mesmas como um exercício de liberdade individual; o direito de qualquer um de nós fazer o que quer relativamente à sua saúde e à sua própria vida, designadamente, destruindo-a. Acontece que ninguém sofre sozinho neste processo de autodestruição, já que há pais, filhos, irmãos, amigos, etc., que também sofrem com a escolha deste caminho. Um homem não pode usar a sua liberdade para abdicar dela e se converter num escravo de uma droga que o vai destruindo. Seria, portanto, um sinal errado se o Estado promovesse a legalização e a venda nas farmácias de drogas que «matam devagarinho».


Devemos desconfiar sempre de um Estado que, com o falso argumento da liberdade individual, deixe de ser regulador, criando na lei alguns limites, devidamente justificados, aos comportamentos individuais; devemos desconfiar de um Estado que, sob o disfarce de um paternalismo permissivo, rejeita a ciência, nega irresponsavelmente a realidade de um mal e evoca critérios errados para justificar políticas que facilitam a autodestruição do ser humano.

Na verdade, se a sra. ministra deseja realmente introduzir medidas que tragam benefícios para os cidadãos, então deve promover campanhas de esclarecimento, informando com rigor científico que as «drogas leves» afinal são «pesadas». Esta medida seria muito bem vista pelos pais, professores e por muitos daqueles profissionais de saúde que lutam diariamente há décadas neste país para retirar milhares de pessoas da escravidão das drogas.

A droga não se vence passando o tráfico das ruas para a venda legal nas farmácias. Esta medida seria um sinal de fraqueza e um gesto de falsa compaixão. A verdadeira compaixão assenta em salvar pessoas, ajudando-as a recuperar o impulso natural do homem, que o leva a agarrar-se à vida, sem drogas.





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