segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Filmes para parvos


Eram filmes que enchiam a alma dos pais e ajudavam a educar os filhos, a despertar a sua sensibilidade e a desenhar o retrato dos heróis


Inês Teotónio Pereira

Na infância dos meus filhos mais velhos eu adorava ir ao cinema com eles. Aliás, gostava mais de ir ao cinema do que eles. Vi os filmes todos que eram para ver e dava graças a Deus por ter filhos porque assim tinha a desculpa de ir às sessões da tarde ver filmes para 4 e 6 anos. Dos «Incríveis», ao «Shrek», passando pelo «Toy Story», pelo «Spirit», pelo «Rei Leão» ou pela «Mulan», vi tudo. Ri-me e em alguns filmes até chorei (quando o Andy abandonou o Woody ou quando o Spirit se perdeu do Índio as lágrimas correram-me pela cara a baixo e os meus filhos ficaram petrificados a olhar para mim). Os filmes da infância dos meus filhos mais velhos eram melhores que os meus filmes de infância. Tinham mais graça, eram mais bem feitos e também nos faziam chorar com os seus actos de heroísmo, de desespero, com as perdas e as conquistas. Eram filmes que enchiam a alma dos pais e ajudavam a educar os filhos, a despertar a sua sensibilidade e a desenhar o retrato dos heróis, das características que forjam os heróis. Filmes com as mesmas lições de moral dos clássicos da nossa infância, como o «Super-Homem», «A Bela Adormecida», «A Gata Borralheira», «O Homem-Aranha», «O Zorro» ou «O Bambi», mas em melhor. A mensagem era sempre a mesma: a humildade, a coragem e a generosidade movem montanhas. Filmes em que os maus são mesmo péssimos e os bons sofrem horrores, mas no final o Bem vence.

Os meus filhos cresceram e estreou a saga de Nárnia. C. S. Lewis veio em socorro da pré-adolescência dos meus filhos e os desenhos animados tornaram-se actores em carne e osso. O Leão, a Feiticeira, o Príncipe Caspian e os quatro irmãos fizeram as maravilhas de muitos domingos à tarde em minha casa.

Mas foi só. Com os meus filhos mais novos já não tive a mesma sorte. Apesar de aparecerem cada vez mais filmes por ano, de as produtoras se multiplicarem, já não é a mesma coisa. Já não há épicos. Nos filmes actuais eu já não choro, durmo. Também já não me rio, chateio-me. Ir ao cinema com os meus filhos mais novos é uma verdadeira seca. Os filmes são vazios, as histórias são infantis de mais para as crianças de 4 anos para quem o filme é indicado e os bons, os maus e os heróis já não existem. Só existem patetas.

A produção infantil, meus senhores, já não é infantil, é só parva. Tudo começa na televisão, que está cheia de séries transmitidas non-stop absolutamente patetas. As crianças ficam petrificadas a olhar para estas coisas que têm o poder de as hipnotizar. É uma espécie de magia negra que lhes desliga metade do cérebro e as deixa meio patetas. Uma história que tenha princípio, meio e fim, ou seja, uma narrativa, já passou de moda. Agora produzem-se «cenas», já não se produzem filmes. E quanto mais absurdas forem as cenas melhor. São programas e filmes que não têm qualquer mensagem, em que não se distinguem as personagens pela personalidade, pelos defeitos e qualidades, mas sim por uma qualquer particularidade absurda.

O mundo em geral, e a indústria cinematográfica em particular, tem um grande problema em relação às crianças: acha que elas são parvas. E à força de tanto insistirem nesta tese as crianças estão de facto a ficar parvinhas. O seu cérebro está direccionado para responder a estímulos e não a sentimentos. São poucas as crianças que têm hoje paciência para ficar uma hora e meia a ver a «Música no Coração», como são poucos os adultos que têm paciência para ver «E Tudo o Vento Levou». Os tempos são outros. Os tempos são da «Casa dos Segredos» e de histórias infantis sobre uma esponja que vive debaixo do mar e que, pronto, vive debaixo  do mar.





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