Isilda Pegado
1 – A Teresinha tinha 6 anos quando a mãe, vítima de cancro da mama, faleceu. Desde um ano de idade que vivia com a mãe, perto dos avós e dos tios maternos. Foram estes a passar mais tempo com ela, durante a doença da mãe. Acima de tudo os primos... de quem tanto gostava, e com quem brincava longas horas…
2 – Durante estes 5 anos teve sempre um relacionamento saudável com o pai. O facto de o pai viver com um companheiro, o Jorge, nunca foi motivo de comentário. Contudo, desde os tempos do divórcio, o pai e os avós maternos ficaram de relações cortadas.
Após o óbito da mãe, a Teresinha foi viver com o pai, e com o Jorge.
3 – Os avós maternos receberam então uma notificação para comparecer em Tribunal onde lhes foi comunicado que a sua «neta» tinha sido coadoptada pelo companheiro do pai, pelo que deixava de ser sua neta. Foi-lhes explicado que por efeito da coadopção os vínculos de filiação biológica cessam.
Nada podiam fazer. Choraram amargamente a perca desta neta (depois da filha)
que definitivamente deixariam de ver e acompanhar.
A Teresinha, que tinha
perdido a mãe, perdia também os avós, os tios e os primos de quem tanto
gostava. Nunca mais pôde brincar com aqueles primos ou fazer viagens com o tio Zé
e a tia Sandra que eram tão divertidos. A Teresinha tinha muitas saudades
daquelas pessoas que nunca mais vira.
4 – Um dia perguntou ao
pai porque mudara de nome. Foi-lhe dito que agora tinha outra família. Não
percebeu e, calou… Na escola, via que os outros meninos tinham uma mãe e um
pai, mas ela não.
5 – Quando chegou aos 16
anos de idade foi ao ginecologista, sozinha. Ficou muito embaraçada com as
perguntas que lhe foram feitas sobre os seus antecedentes hereditários
maternos. Nada sabia. Percebeu que o médico não a podia ajudar na prevenção de
varias doenças... Estava confusa. Nada sabia da mãe. Teria morrido? Teria abandonado
a filha?
6 – Até que um dia
descobriu em casa, na gaveta de uma cómoda, um conjunto de papéis em cuja
primeira página tinha escrito SENTENÇA. E leu... que «o superior interesse da
criança» impunha a adopção da menor pelo companheiro do pai, cessando de
imediato os vínculos familiares biológicos maternos, nos termos do disposto no
art. 1.986.º do C.C., tal como o apelido materno (Passos) (art. 1988.º n.º1 do
C.C.) que era agora substituído por... Tudo por remissão dos art.s X.º a Y.º da
Lei Z/2013.
7 – O que mais a
impressionara naquele escrito foi o facto de que quem a escrevia parecia estar
contrariado com a decisão que estava a tomar. E, a dado passo escrevia «Na
verdade, quando da discussão da lei Z/2013 na Assembleia da República o
Conselho Superior da Magistratura e a Ordem dos Advogados emitiram parecer
desfavorável à solução legislativa que agora se aplica. Porém, «Dura lex sede
lex». A Teresinha não percebeu...
8 – Durante anos
procurou a Família materna, em vão... Mas rapidamente consultou os Diários da
Assembleia da República onde constavam os nomes dos deputados que tinham
aprovado aquela lei que lhe tinha roubado os mimos da avó Rosa, as brincadeiras
do avô Joaquim... e os primos.
9 – Leu então num livro
que «a adopção é uma generosa forma de ajudar crianças a quem faltam os pais e
a família natural para lhes dar um projecto de vida. A adopção é sempre
subsidiária».
E perguntou — Onde está a minha família que nunca me faltou mas, de mim foi
afastada por estatuição legal e decisão judicial?
A Teresa está muito triste.
10 – O pai e o Jorge
entretanto divorciaram-se… e a Teresa é obrigada a ir passar os fins-de-semana
a casa do Jorge… porque a Regulação das Responsabilidades Parentais assim o
ditou.
11 – Teresinha, nós
estamos aqui!
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