Afonso Espregueira, Observador, 1 de Fevereiro de 2017
A eutanásia não é uma escolha do doente, antes é uma decisão da
sociedade, que através da lei define quem pode a ela recorrer, e do corpo
clínico, que decide nos casos concretos se estes estão na lei.
A eutanásia é a última expressão da vontade e liberdade do doente. Numa
situação de sofrimento insuportável e doença incurável, o doente deve poder
decidir pôr fim à sua vida e pedir a morte assistida. É um legítimo exercício
da sua autodeterminação, a derradeira manifestação da sua autonomia.
É nesta simples mas poderosa ideia, que coloca a liberdade como o valor
máximo (mesmo acima da vida), que se baseiam os defensores da eutanásia. Mas
será mesmo assim? Será a eutanásia o exercício derradeiro da liberdade?
Julgo que não. Julgo que, na verdade, não está em causa a liberdade do
doente e que a decisão pela eutanásia, em última análise, não é sua, mas de
terceiros. E, como ninguém pode decidir tirar a vida a outrem, a eutanásia não
é admissível.
É importante notar que a eutanásia será sempre enquadrada numa lei, onde
se definirão as situações em que esta é permitida. Podem ser termos mais ou
menos concretos ou subjectivos, mas será sempre o legislador, em representação
da sociedade, a determinar que casos podem ou não ser sujeitos a eutanásia.
Para além disso, haverá um corpo clínico a ajuizar a situação específica do
doente, decidindo se a lei é aplicável ao seu caso e portanto se o pedido de
eutanásia deve ou não ser respeitado.
Quer isto dizer que certas pessoas que requeiram a eutanásia verão o seu
pedido rejeitado e, poder-se-á dizer, à luz do que foi dito acima, a sua
liberdade coarctada. Alguns doentes (de primeira ou de segunda, depende do
ponto de vista) terão a «morte assistida» como querem; outros não.
Mas se assim é, saímos da esfera da liberdade individual. Afinal, a
eutanásia não é uma escolha do doente, antes é uma decisão da sociedade, que
através da lei define quem pode ou não recorrer à eutanásia, e do corpo
clínico, que decide nos casos concretos se estes estão ou não dentro da lei.
Assim, legalizar a eutanásia trata-se, na verdade, de permitir que a
sociedade, personificada na equipa médica, decida quem vive e quem morre, o que
é extremamente perverso.
A menos, claro, que em nome da coerência, os defensores da eutanásia
argumentem que esta é legítima em qualquer situação, que qualquer pessoa a pode
pedir e que o seu pedido será sempre atendido, independentemente do seu estado
de saúde. Porém, aqui já não estamos no campo dos casos extremos de que tanto
nos falam e que a todos enche de compaixão. Estamos, sim, perante uma apologia
do suicídio. E isso não é de todo admissível.
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