segunda-feira, 24 de outubro de 2016


Árvore genealógica original...



Luiz Fernando Veríssimo

— Mãe, vou casar!

— Jura, meu filho?! Estou tão feliz! Quem é a moça?

— Não é moça. Vou casar com um moço. O nome dele é Murilo.

— Você falou Murilo... Ou foi meu cérebro que sofreu um pequeno surto psicótico?

— Eu falei Murilo. Por quê, mãe? Tá acontecendo alguma coisa?

— Nada, não.. Só minha visão que está um pouco turva. E meu coração, que talvez dê uma parada. No mais, tá tudo óptimo.

— Se você tiver algum problema em relação a isto, melhor falar logo...

— Problema? Problema nenhum. Só pensei que algum dia ia ter uma nora... Ou isso.

— Você vai ter uma nora. Só que uma nora... Meio macho. Ou um genro meio fêmea. Resumindo: uma nora quase macho, tendendo a um genro quase fêmea...

— E quando eu vou conhecer o meu. A minha... O Murilo?

— Pode chamar ele de Biscoito. É o apelido.

— Tá! Biscoito... Já gostei dele... Alguém com esse  apelido só pode ser uma pessoa bacana. Quando o Biscoito vem aqui?

— Por quê?

— Por nada. Só pra eu poder desacordar seu pai com antecedência.

— Você acha que o Papai não vai aceitar?

— Claro que vai aceitar! Lógico que vai. Só não sei se ele vai sobreviver... Mas isso também é uma bobagem. Ele morre sabendo que você achou sua cara-metade... E olha que espectáculo: as duas metade com bigode.

— Mãe, que besteira ... Hoje em dia ... Praticamente todos  os meus amigos são gays.

— Só espero que tenha sobrado algum que não seja... Pra poder apresentar pra tua irmã.

— A Bel já tá namorando.

— A Bel? Namorando?! Ela não me falou nada... Quem é?

— Uma tal de Veruska.

— Como?

— Veruska...

— Ah!, bom! Que susto! Pensei que você tivesse falado Veruska.

— Mãe!!!...

— Tá..., tá..., tudo bem... Se vocês são felizes. Só fico  triste porque não vou ter um neto...

— Por que não? Eu e o Biscoito queremos dois filhos. Eu vou doar os espermatozóides. E a ex-namorada do Biscoito vai doar os óvulos.

— Ex-namorada? O Biscoito tem ex-namorada?

— Quando ele era hétero... A Veruska.

— Que Veruska?

— Namorada da Bel...

— «Peraí». A ex-namorada do teu actual namorado... é a actual  namorada da tua irmã. Que é minha filha também... Que se chama Bel. É isso? Porque eu me perdi um pouco...

— É isso. Pois é... A Veruska doou os óvulos. E nós vamos  alugar um útero.

— De quem?

— Da Bel.

— Mas... Logo da Bel?! Quer dizer então... Que a Bel vai  gerar um filho teu e do Biscoito. Com o teu espermatozóide e com o óvulo da namorada dela, que é a Veruska...

— Isso.

— Essa criança, de uma certa forma, vai ser tua filha, filha do Biscoito, filha da Veruska e filha da Bel.

— Em termos...

— A criança vai ter duas mães: você e o Biscoito. E dois pais: a Veruska e a Bel.

— Por aí...

— Por outro lado, a Bel... além de mãe, é tia... ou tio....  porque é tua irmã.

— Exacto. E ano que vem vamos ter um segundo filho. Aí o Biscoito é que entra com o espermatozóide. Que dessa vez vai ser gerado no ventre da Veruska... Com o óvulo da Bel. A gente só vai trocar.

— Só trocar, né? Agora o óvulo vai ser da Bel. E o ventre da Veruska.

— Exacto!

— Agora eu entendi! Agora eu realmente entendi...

— Entendeu o quê?

— Entendi que é uma espécie de swing dos tempos modernos!

— Que swing, mãe?!!....

— É swing, sim! Uma troca de casais... Com os óvulos e os espermatozóides, uma hora no útero de uma, outra hora no útero de outra...

— Mas…

— Mas uns tomates! Isso é um bacanal de última geração! E pior... com incesto no meio...

— A Bel e a Veruska só vão ajudar na concepção do nosso  filho, só isso...

— Sei!!!... E quando elas quiserem ter filhos...

— Nós ajudamos.

— Quer saber? No final das contas não entendi mais nada. Não entendi quem vai ser mãe de quem, quem vai ser pai de quem, de quem vai ser o útero, o espermatozóide... A única coisa que eu entendi  é que...

— Que…?

— Fazer árvore genealógica daqui prà frente... vai ser...





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